Qual o seu motivo para estar nas olimpíadas científicas?

, 1 de setembro de 2021

Nesse post conto um pouco da minha história nas olimpíadas e como essa pergunta foi importante para minha trajetória.

OBS: Eu vo dar uma misturada entre falar as coisas de maneira séria e de maneira idiota, então desculpa se em alguns momentos eu parecer muito frio e calculista 👺

“Tu é burrão Caio? Eu to numa olimpíada para pegar a medalha da olimpíada ué.”

Mas é realmente isso? Você dedica horas e horas do seu dia, procura melhorar, se dedica ao máximo pra ter avanço simplesmente por uma medalha que não te da dinheiro, status ou fama?

Muitas pessoas não possuem um motivo tão claro estudando olimpíadas, apenas seguem a sua vontade e dão o seu máximo, e você pode me perguntar: “Qual o problema de ser assim Caio? Você precisa tanto ter um motivo claro?”

No meu decorrer nas olimpíadas, entre risadas, xingamento e muita jogatina de Skyrim na noitada, teve muitos momentos que eu fiquei incrivelmente abalado, sozinho e me sentindo absurdamente derrotado, e algumas vezes eles sempre tocavam no mesmo ponto: porque eu me dediquei tanto pra essa olimpíada?

Quando eu tava no primeiro ano do ensino médio, eu fiquei vidradasso a estudar e ter conquistas acadêmicas, convicto na minha mente de que quanto maior o resultado que eu obtivesse, mais feliz eu estaria. Nessa época me falaram da IJSO (Internacional Junior Science Olympiad, Olimpíada Internacional de Ciências Júnior em hebraico), e eu tive certeza que era aquilo que eu queria ir atrás, aquilo que ia me dar a maior felicidade possível, e foi uma jornada muito longa: estudei para caramba, li uns 500 livros, fiz uns 3000 exercícios e me abalava legal quando não tava conseguindo chegar longe (um dia eu conto da minha experiência até chegar na IJSO, mas o foco aqui é outro).

No fim, depois de dar a vida nessa olimpíada, consegui passar pra IJSO, e eu fiquei felizasso, tava me sentindo no ápice da minha vida, porque eu sentia como se tivesse escalado o monte Everest sonhando durante todo o trajeto em chegar no topo, e finalmente tinha conseguido. Porém, foi aí que tudo desandou: Depois de 3 dias de felicidade extrema, a minha vida seguiu da mesma maneira que antes, e eu não tive a felicidade eterna e suprema depois da olimpíada, e nisso eu comecei a ficar confuso, pensando porque eu me esforcei tanto se no fim o máximo que eu recebi foi um parabéns. E esse foi o meu erro: ao me comparar com um alpinista escalando o Monte Everest, eu esqueci que o prazer dessa atividade não está em chegar no topo, mas sim atravessar seu trajeto.

Mas eu não fiz isso, passei horas sozinho, não desenvolvi nenhuma amizade forte e não criei memórias pra eu me apegar, então era como se eu tivesse chegado no topo da montanha sem nada além do resultado. Nisso eu senti um vazio enorme e quis desesperadamente ter aquilo que eu não adquiri nos meses de estudo, queria mais que tudo ter amigos de verdade, queria ter memórias importante e queria ser importante pra uma pessoa pra eu não sentir que todo o meu estudo foi em vão, mas não dava pra compensar tudo da noite pro dia, e tudo isso só me deixou ainda mais triste. Eu, no fim não tinha nada, porque eu errei acreditando que o resultado me daria a felicidade eterna e não aproveitando o processo até o topo. Esse é o meu primeiro ponto: se eu soubesse desde o começo que eu deveria curtir o processo pois o resultado não me daria uma felicidade gigante, eu poderia ter feito as coisas diferente, rido um pouco com os outros, tentado me divertir mais, e nisso que eu acho que ter seus motivos certos, assim como o conhecimento de motivos frágeis que quebram no fim, o permite curtir o seu resultado bem mais do que eu.

Não teve segredo pra lidar com esse vazio, eu fiquei muito tempo me sentindo triste e sozinho e sem importância no mundo ou coisas pra eu me apegar. Depois de uns 3 meses desde a IJSO, eu comecei a desabalar, criei laços melhores com os outros e fugi um pouco desses problemas decidindo agora estudar pra física, sonhando em ir pra IPhO mas dessa vez curtindo o processo (daí as grandes noites de Skyrim). Nesse momento o meu sonho ficou: quero ir pra IPhO, não sei o porquê, mas eu quero e sei que tenho que curtir o processo.

Por meses na quarentena eu fiquei trancadão no meu quarto estudando física e tentando curtir também (apesar de que houveram abalos pra caramba nessa época, mas não falo porque é meio vergonhoso, desculpe por ser cringe 😩), mas nessa eu não falei com quase ninguém que tava estudando física e assim eu não tinha a mínima ideia de como eu tava de conhecimento em relação aos outros, mas eu tava querendo muito ir pra IPhO e eu botava fé que minhas horas de estudo tavam dando resultados.

Chegou então setembro de 2020 com o grandioso CF (Campeonato de Física em braziliense) e eu tive minha chance pra testar o quanto eu tava sabendo de física: por ser gratuita e feita por ex-medalhistas, muita gente que tava na mesma que eu ia ali pra testar o quanto tava sabendo das coisas. Depois de meses estudando e sofrendo abalo por causa da quarentena, eu finalmente ia ter minha chance de testar minhas habilidades, e eu sonhava em pegar os melhores resultados possíveis pra eu sentir que meu estudo valeu a pena.

Mas não foi isso que aconteceu: pros que não tão cientes de como o CF rola, a cada semana é liberado um problema e você tem que resolver antes que o próximo seja liberado, e depois de 4 problemas eles iam começar a liberar as soluções, dando também os resultados junto com o prêmio de “Melhor solução”, e era óbvio que eu tava almejando pegar esse prêmio, mas toda semana que eu tinha expectativas, chegava algum outro ADM do Olímpicos e me destruía indo absurdamente melhor que eu (literalmente os outros ADM do olímpicos, eu fui jantado por eles em jeitos que não são descritos em palavras) e lá eu senti o abalo do abalo: po, eu queria tanto ir pra IPhO, tava estudando o máximo e tentando não cair no problema de não aproveitar, porque eu não consigo nem estar perto do TOP3 do Olímpicos? Eu so tão ruim assim? Nunca vou conseguir chegar na IPhO?

Nessa hora eu de novo abalei porque senti que tudo foi em vão e que não tinha jeito de ir pra IPhO agora, não tinha mais confiança nenhuma no meu potencial ou habilidade, e sinceramente pensei em desistir. Eu falei bastante com meus pais e amigos naquela época, porque a derrota tirou qualquer força de vontade pra correr (não que eu parei de estudar mais, eu ainda tentava seguir o meu ritmo padrão, mas eu simplesmente não confiava mais em mim mesmo), e lembro que meus pais uma hora disseram: “Caio, você não vai usar essa medalha pro seu futuro, você não ganha nada com ela, então você não precisa ir pra IPhO, porque você não aperta o freio nessa ae e larga mão dessa vontade absurda de ir pra IPhO?”

Nessa hora eu aceitei os fatos: eu tava estudando dia e noite pra passar na IPhO, mas isso é só por causa de uma olimpíada, porque eu quero tanto isso? Eu não vou usar pra nada no futuro e esse desejo bizonho tá me deixando mal, sem falar que eu não estou sonhando em melhorar, mas sim em ser melhor que os outros, além de que nunca vou ter garantia que sou melhor que alguém, talvez eu só devesse largar esse sonho logo.

Nisso era como se eu tivesse aceitado a derrota: larguei mão de querer ir pra IPhO, e nisso eu achava que eu ia parar de estudar física também porque não tinha mais motivo pra isso, mas foi aí que eu errei: mesmo aceitando a derrota e sem vontade de continuar a buscar aquele resultado, eu ainda acordava no dia seguinte e ia pegar um pdf na internet, ainda fazia exercícios, ainda lia teoria nova, ainda tirava dúvidas com meus professores, e ainda queria melhorar. Foi aí que as coisas mudaram na minha cabeça e tudo fez sentido: querer passar pra IPhO era uma máscara que eu colocava na minha cara acreditando que ela aumentava o meu potencial, força de vontade e me afastava dos meus problemas. Era como se essa máscara aumentasse a minha luz e mostrasse minha habilidade máxima, mas quando eu larguei ela, na hora da derrota, percebi que aquela máscara nunca me deu luz nenhuma, ela só barrava a minha verdadeira luz que dizia: “Eu quero estudar física porque eu gosto disso, quero melhorar a mim mesmo, e que se dane se eu sou o melhor ou não”. A minha motivação para fazer olimpíadas por só querer a medalha era, na verdade, uma corrente que me prendia, me pressionava a ser eficiente, me impedia de ser livre e de estudar o que eu queria quando eu queria, me forçava a ser sempre o melhor, senão meu sonho não seria realizado.

Quando eu percebi isso, continuei a estudar física, sempre no nível de olimpíadas porque era o que eu gostava, mas sem mais a preocupação de ir pra a IPhO ou não, me preocupando unicamente em melhorar a mim mesmo porque era isso que eu gostava, e essa falta de preocupação tornou tudo muito mais agradável, e me fez melhorar exponencialmente nos meus estudos, e nisso que eu percebi: o meu problema não era de repertório, não era porque eu não tava curtindo, não era porque eu não tava estudando muito, era porque eu não sabia de verdade o motivo pelo qual eu estudava física. Não é como se esse coach tivesse sido 100% funcional a todo momento: durante a seletiva final pra decidir quem ia pra IPhO, eu queria muito passar e fiquei abalado pensando que eu não poderia passar por causa de uma coisa ou outra, mas eu não pensava nem um pouco nisso na hora de estudar, eu só queria me divertir e melhorar a mim mesmo, e se mesmo assim eu não fosse o melhor, eu não ligava mais. No fim eu consegui passar pra IPhO e graças as carteações do Ivan Guilhon consegui pegar um ouro lá, mas o coach ainda se mantia, eu só tava feliz de ter dado o meu máximo e curtido o processo, a medalha foi um bônus, não a recompensa das minhas horas de estudo.

Nisso, eu acredito que todo aquele sofrimento da IJSO valeu a pena, porque ele pavimentou a estrada que me levou a entender realmente a mim mesmo: eu faço coisas na minha vida porque eu gosto de ser desafiado e quero melhorar. Se eu vou ser melhor que alguém ou não, tá longe do meu real objetivo (tudo bem que eu ainda quebro esse coach e me preocupo às vezes se eu to muito pior que outros, mas sempre tento me basear na minha média ao falar sobre o assunto, e na média eu só tentava curtir o processo).

Eu então entendi o meu motivo pra estudar pras olimpíadas e tudo ficou mais claro, meu estudo foi muito mais divertido. Então eu te pergunto: pode ser porque você queira estudar no exterior e a medalha possa te ajudar, pode ser porque você queira passar na USP/Unicamp por medalhas, pode ser porque você gosta de se desafiar, pode ser porque dar o seu máximo numa olimpíada foi um jeito de você encontrar pessoas parecidas com você, pode ser que estudar pras olimpíadas foi sua última promessa pra alguém que você amava, mas no fim das contas, qual o seu motivo pra estudar pras olimpíadas? (seloco, que final poético, nem parece que fui eu que escrevi)